Experimentalismos Acessíveis
EXPERIMENTALISMOS ACESSÍVEIS
por Marco Andreol
• Para introduzir uma breve história da música popular independente e experimental recente vale lembrar das pequenas, mas diversas rupturas que aconteceram na última década.
Quais os pilares mais fundamentais desse período de ebulição em constante expansão – que ainda passam despercebidos até mesmo ao público interessado na contemporaneidade e disposto a compreender, com prazer, que o que não soa batido gera novas sinapses, tesão e refresca os ouvidos.
O tempo nunca parou. Ou será que, enfim, parou de parar?
É preciso voltar ao presente. E é impossível fazê-lo sem visitar o passado recentíssimo ou remoto.
DECONSTRUCTED CLUB e AIRY
Romper com a geometria regular dos loops e a grade rítmica dos programas de computador é, sem dúvida, a maior revolução da eletrônica independente dos últimos 30 anos.
Ao invés de prender-se à estrutura imposta pelo programa (DAW), experimentar substituir o minimalismo onipresente por mais DINÂMICA e variações dentro e fora do compasso, durante e através de partes bem diferentes entres si são algumas das soluções mais excitantes e promissoras para a Música do século 21. As novas possibilidades de manipulação digital e a composição algorítmica nas pistas permitiram transpor os limites dos sequenciadores.
Para progredir além das FORMAS pré-estabelecidas, ou seja, além dos gêneros, é preciso aceitar que o que ouvimos desde o Acid House (80s), ou até antes, da Disco de Giorgio Moroder (70s) é insuperável. Quando nos repetimos ad infinitum estamos, de certo modo, descartando os artistas originários, empurrando cópias massificadas a gerações posteriores e, consequentemente, causando percepções desconexas do tempo ao invés de defender e resgatar a história registrada, e deixando de revelar e vivenciar o que há, de fato, contemporâneo.
Ice_Eyes – Constantly Being Broken _ 2018
Pesada ou leve, com timbres estranhos ou suaves, com bateria ou sem, usando desenho de som apurado ou não, as possibilidades são infinitas quando se vai além das fronteiras tecnológicas que nos empurram, quase sempre, a uma única forma de organização musical. A arte acontece quando limites são vencidos, justamente o oposto de seguir os tutoriais de tecnologia ou a teoria musical à risca, sem o jogo de cintura que faz a diferença.
Alguns ainda perguntam: como dançá-las? Basta permitir abrir-se ao extenso leque de alternativas e o corpo encontrará um caminho. Coloque-se na música. O balé moderno faz isso desde que Loie Fuller mudou-se de Chicago para Paris em 1891 e provou que a dança existe através de qualquer maneira.
33emybw – English (Miiin Remix) _2018
MÚSICA ESTEREOFÔNICA EXPANDIDA
Muito além do Ambient, do Drone ou de qualquer outro gênero livre de baterias ou percussões, a música que usa tecnologia de ponta para criar ambientações multidimensionais chegou recentemente num lugar em que o próprio som é TÃO impactante e permite tanta dinâmica – algumas vezes apenas através de um único timbre – que outros elementos outrora fundamentais como ritmo, tonalidade, melodia, harmonia parecem meros artifícios. É incrível, mas alguns artistas chegaram no que poderia ser chamado, no espanto da primeira audição, de pós-música.
Se o sistema de som for apuradíssimo em evidenciar cada faixa de frequência, como no Dolby Atmos, por exemplo, a experiência é solar.
Mesmo para a estereofonia da qual estamos acostumados existem recursos novos que, no tratamento final da produção e na mixagem, causam a impressão de dilatamento do campo perceptível e permite maior liberdade às técnicas de desenho de som, surge então uma vasta paisagem espectral que insinua incontáveis camadas a serem exploradas pelo artista-técnico – horizontalmente, verticalmente, é claro, mas também alçando outros eixos, permitindo a compreensão esférica do som mesmo sem o deslocamento do ouvinte e, atenção: essas sensações são perceptíveis num par de caixas caseiras!
Paul Jebanasam _ Depart As | Air dx stop ∂ρ/∂ /dt Somewhere = +∇⋅(ρ sigma*(y waiting -x) v)=0 ∂ρ/dy/dt for = you x dim _ 2016
Herdeiros da Música Acusmática (eletrônica erudita) que há quase 5 décadas usa 8, 16, 32 canais, etc. (caixas acústicas ou fontes), esses artistas populares – porém alternativos – de certa forma começam a tornar a audição pluri, multidimensional mais acessível, já que, para ouvir Acusmática, há pouquíssimos espaços no país e no mundo.
É importante dizer que essa gama de subgêneros abstratos é composta PARA e ATRAVÉS do SOM em SI, em outras palavras, não estamos falando simplesmente de um equipamento que usa novos recursos de reprodução para gerar atmosferas sofisticadas para todo e qualquer gênero, mas é a própria mutação dinâmica do som (corte de fases, som refletido, etc.) que determina a composição e, portanto, o tipo de música.
L.A. BEAT encerra de vez a era dos breaks sampleados
Apesar de Flying Lotus ter alcançado, ainda em 2008, seu próprio estilo ao fundir Hip Hop, Jazz Contemporâneo e IDM extremamente oblíquo, repleto de texturas ásperas e batidas esmagadas por compressores, o L.A.BEAT precisa ser citado para compreendermos por quê esses sons do extremo-ocidente americano (que,inclusive, recebem influências do Japão) irromperam um novo cosmos para que a síncope rítmica alargada ao extremo (por isso oblíqua) seja elemento frequente e incorporado no experimentalismo de pista de diversas formas. Estamos falando aqui do término (definitivo?) dos breaks como os conhecíamos até o final da década de 2000: geralmente sampleados de clássicos dos anos 60 e 70 e então acelerados, no caso do Drum N Bass, do Big Beat, ou desacelerados, no Trip Hop, etc.
Não mais limitados a um looping sampleado – graças a tecnologias relativamente recentes – os músicos saem e entram do compasso, aproximam e distanciam as peças das baterias criando um balé percussivo coeso, mas sem os extremismos quase aleatórios do Breakcore e adjacências bastante exploradas há décadas por Aphex Twin, Mike Paradinas, etc.
Flying Lotus e seu selo Brainfeeder reverenciam no L.A. Beat o pioneirismo de Ras G. (falecido em 2019), porém as mutações e híbridos do gênero estão vivas e avançam principalmente pelas mãos, corações e mentes de Afrikan Sciences (NY) e de Olof Melander, sueco que produziu os três últimos excelentes álbuns de Moor Mother. É o presente do Future Jazz rompendo o Hip Hop.
Flying Lotus _ Zodiac Shit _ 2010
LEFTFIELD BEATs
Do Jungle ao 2-Step Garage ao Dubstep ao Pós-Dubstep (nessa sequência) percorreram-se duas décadas até que chegássemos nessa gama meio eclética de LEFTFIELD BEATs (nome não oficial). Aqui não há batidas retas e os breaks interagem por toda paisagem sonora sem se imporem como elemento principal. Londres e Manchester são a fonte. Podem tender ao Tribal, ao IDM (exemplificado no player), ao UK Bass, ao Airy Deconstructed, pós-Crunk, pós-Grime, eis a variedade que os colocam na vantagem do experimentalismo e do caminho indefinido, por isso interessante. Há mais dinâmica e espaço para as atmosferas desenvolverem-se, envolvendo o ouvinte justamente por causa da não-proeminência da bateria. Tudo primorosamente disposto na grade rítmica. De fato, entre os sons do século 21, esses ritmos são a mais certeira alternativa depois de quatro décadas de Techno e House para quem se interessa na evolução da Música, mas não abre mão da pista.
Call Super _ I Look Like I Look In A Tinfoil Mirror _ (álbum *ARPO*) _ 2017
GLOBAL BASS
Há pouco tempo a música eletrônica era sinônimo de Europa e nordeste americano. Sem cair em regionalismos revisitados, orientalismos reducionistas ou na generalidade de termos como World Music, o Global Bass é o melhor nome para assinalar o fenômeno da Eletrônica que simultaneamente distancia-se do regionalismo puro de cada região do planeta (absorvendo a Eletrônica ocidental), mas que ao mesmo tempo SOMA características próprias de cada Cultura – é uma ponte entre universos, a globalização saudável que não descarta tradições.
Desde o Gqom da África do Sul, ao Singeli da Tanzânia, a uma diversa leva de Reggaeton verdadeiramente renovado espalhada pela América Latina e Ibéria, passando por tambores chineses e influências do Baile Funk na eletrônica europeia até os subúrbios africanos de Portugal, podemos dizer com toda certeza que a eletrônica conseguiu chegar, enfim, aos 4 cantos do mundo.
Eletrônica não apenas como um recurso tecnológico, mas também como diversidade na composição através do resgate da tradição popular para a atualidade.
Aghnie _ Mendisi _ 2017
TEXTURAS/ TRANSPARÊNCIAS sobre bases PERMEÁVEIS/ CÔNCAVAS
Desde *Parallel Dimensions* de 2000, álbum de Theo Parrish, o modo em que o produtor mixa bumbo e chimbais na House pode ser tão ou mais importante que a estrutura rítmica: são as texturas que enfatizam e até determinam certo clima/atmosfera. Nada novo até aqui – o Punk Rock é baseado nessa precariedade intencional; shows históricos dos anos 70 (como o dos Doces Bárbaros em 1976) partilham da mesma ideia quando decidem não gravar as músicas em estúdio. Porém, desde o Pós-Punk, a qualidade técnica de mixagem e masterização vêm evoluindo com o propósito de tornar cada elemento único e coeso numa música, tal percepção continua expandindo-se até a maestria da gravação do show do Portishead em 1998 – que soa tão bem quanto seus álbuns de estúdio. Esse processo também possibilitou a popularização do Minimal Techno ou do Micro House, gêneros da virada do milênio que dependem da qualidade de reprodução de áudio para vingarem, principalmente por causa da necessária separação nítida entre as frequências. Em seguida, naturalmente, surge a oposição – a Vaporwave, inventada em 2009 por Daniel Lopatin (OPN), manda às favas o preciosismo técnico em prol da estética.
Não por coincidência, a Vaporwave então liberta, indiretamente, os gêneros mais clássicos da Eletrônica de pista – Techno e House – da concepção de como deveria soar cada um dos timbres numa música. Mais interessante do que passar a música inteira num tape para que soe como um K7 antigo, Actress (já em 2008) e Andy Stott passam a testar CONTRASTES entre camadas ruidosas, ásperas, pantanosas, opacas e graves bem definidos; ou entre hi hats brilhantes e outros sons enevoados, mergulhados em reverberações que flutuam SOBRE as bases. [É importante dizer que o Dub Techno, mais antigo e precursor, faz isso de OUTRA forma].
Andy Stott _ Luxury Problems _ 2012
Dentro dessa lógica de contrastes podemos achar vários exemplos desde que a música passou a ser gravada, há mais de 100 anos. Na eletrônica erudita, por exemplo, essa ideia é presente desde quando Pierre Schaeffer cunhou o termo *Música Concreta* em 1948. Por isso é um desperdício que esse recurso/estética – a ideia de misturar ou sobrepor contrastes – ainda seja tão pouco assimilada por aqui, mesmo depois de uma década em que esses álbuns exemplificados nos players levaram ao máximo o jogo entre claro/escuro às pistas.
Actress _ Shadow From Tartarus _ 2012
HYPERPOP / PC MUSIC / ORANGE MILK RECORDS / COLLAGE / TRANCE HAUNTOLOGY / OPN
Como esse que vos fala sempre teve uma percepção heterodoxa da Música (e assim continuará a ser), costumo colocar essas classificações no mesmo grupo – apesar de terem características próprias – por entender que há intensões comuns entre elas.
É senso comum e um equívoco acreditar que o experimentalismo deve ser sisudo ou complexo, ruidoso, que não pode haver humor, ironia, ou, do contrário, que o Pop é sempre fórmula para celebridades dotadas de tipos vocais manjados e beleza física padronizada, interessadas somente em palco e entretenimento. Então, inicialmente, é preciso separar Pop de mainstream. O segundo, na maioria das vezes, tem grande dificuldade em ousar porque tenta agradar a maior variedade de público possível, ou busca, oportunamente, um viés pseudo-politizado no discurso, quase nunca na forma.
O extremo da ironia apresentada pela PC Music ou pelo Hyperpop pode ser muito mais fiel a um retrato da realidade do que um texto objetivo, e o álbum de SOPHIE de 2018 prova isso sem julgamento algum. SOPHIE, inclusive, questionou a própria noção de realidade.
No caso de Lorenzo Senni, por exemplo, seus arpejos que se parecem a tutoriais de Trance já na fase de pasteurização do gênero causam, a princípio, a impressão de estarmos ouvindo um pastiche, quando, na verdade, ele consegue desviar-se do paradigma musical que havia até a primeira década do milênio. Lorenzo está, desde 2012, no limiar entre o revivalismo ingênuo e a pura música conceitual _ dependendo do ângulo ou da referência do ouvinte pode ser uma coisa e/ou outra, portanto, a apreciação de sua música deve ser pluridimensional, irônica e/ou não.
O mais interessante, em boa parte desses casos, não é só a releitura de timbres que pareciam totalmente esgotados pela velocidade do descarte na Música das últimas 4 décadas, é também uma mudança radical na eletrônica alternativa (especialmente no caso do selo Orange Milk): a composição pode começar de um jeito e mudar totalmente de direção, pode começar como uma cantiga de ninar e acabar numa colagem de House passando por instrumentos orquestrais, ou partir de uma base de Metalcore para transformar-se num Psy-Trance com vocais melados de FM. / 2022 é 1992 em 1962? / Música Concreta, infantil ou instalação sonora? TUDO É POSSÍVEL ao mesmo tempo, não há gênero definido, o que nos leva, sobretudo, a uma oposição à música que se desenvolve a partir do bumbo e chimbal no contratempo do começo ao fim. As sutis variações que mantiveram o techno, o house e adjacências apartados do mainstream são cada vez mais raras. É quase impossível superar os clássicos originários.
Matthew D. Gantt _ Luxe Market Intermediary _ 2020
DEMAIS HÍBRIDOS
Parece que pelo menos há uma década estamos numa fase de ebulição do que virá a ser em breve. Tudo o que foi relevante na década de 10 (depois da ruptura causada pelas redes sociais e gêneros só existentes na internet, como a brevíssima vida criativa da Vaporwave, entre 2009 e 2015 +/-) é uma fusão de possibilidades que a era anterior, a dos revivalismos, por algum motivo mercadológico não permitia desenvolver-se.
O que chamo de era de revivalismos: Depois da era de ouro da eletrônica alternativa sequenciada e instrumental (de 1986 a 1995, aproximadamente) e a banalização do ecstasy como droga-portal houve uma busca dos millennials em entender o que de fato aconteceu nesse período para além do comércio. De meados/finais dos anos 1990 até o começo da década de 2010, a própria Música parece ter registrado em si mesma a busca por sua real arqueologia desde os anos 1960. Livres do crivo e dos preços das lojas de CD tínhamos enfim as redes de compartilhamento de mp3 e um universo para mergulhar.
Vivíamos em décadas mixadas _ Da nova Bossa de Stereolab ao Funk Rock eletrônico de Chemical Brothers ao visual kraftwerkiano de Daft Punk; à Indietronica de Caribou, Atlas Sound; ao Post-Rock (de Broadcast a Tortoise, ao Dream Pop de Beach House); à Nu Disco de Lindstrøm e Glass Candy a fusões com Krautrock; ao virtuosismo de Mathew Jonson ou Stephan Bodzin que levaram ao extremo as possibilidades dos sintetizadores clássicos à pista; ao Electroclash; à psicodelia de Animal Colletive, Ariel Pink; do Synth Pop obscuro de John Maus, TR/ST e Geneva Jaccuzi, ao Pop House de Azari & III e Hercules & Love Affair, até mesmo ao delicioso saudosismo early 90s rave de Lone, quase tudo tinha relação direta com a década de 60, 70, 80 ou o começo dos 90.
Gêneros como Techno e House continuaram evoluindo, mas muito pouco, se compararmos com o insuperável boom da virada dos 80 para os 90 até meados.
Para compensar essa sensação de nostalgia sem perspectiva, provavelmente sintoma de começo de milênio, a satisfação na pesquisa era intensa. E como cada geração deve questionar a anterior para o bem e para o mal delas mesmas, hoje temos mastigados nos serviços de streaming o que nos soa familiar – a “grande variedade” disponível ilude porque a Música é muito mais diversa do que (a)parece no Spotify.
Na década de 2000 podemos contar facilmente os que souberam contornar os revivalismos: Burial e Shackleton no Dubstep; o IDM que continuou avançando bem até meados dos anos 00s; o Grime que começava a configurar-se antes de tornar-se abstrato e instrumental: uma potência a ser fundida; as quebras surreais e imersivas de Ricardo Villalobos e Isolée; a reinvenção da psicodelia eletroacústica e primitivista de Jan Anderzén e o selo Fonal; até Tim Hecker, Christian Fennesz e, principalmente, Leyland Kirby ao lidarem com a matéria sonora. São poucos os músicos que caracterizam a década de 2000 e anunciam o novo século sem a necessidade de relerem ou referenciarem-se tão diretamente ao passado.
Kemialliset Ystävät [Jan Anderzén] _ Nijura _ 2014
O que comumente vemos hoje é um retrato tardio dos anos 90 que nem se encaixa em termos de revivalismos, porque no revival criativo, o(a) artista ou o(a) DJ sabem a quem se referem e baseiam, sabem o que se está repetindo ou copiando, ao invés disso, parece mesmo que não há o conhecimento básico da música independente de meados dos anos 1980 para cá, a indústria do comércio venceu, e argumentar que não é preciso – nem mesmo interessante – conhecer as últimas décadas além do que se tocava nas rádios pode ser o resultado de um período de underground intenso, prolífico – cujo auge é a primeira metade dos anos 90 – mas que não irrompeu totalmente à superfície, seguido de uma era de revivalismos. Como resultado há um hiato de conhecimento generalizado em relação à Música dos últimos 30 ou 40 anos que ainda soa atual. Cabe questionar também o senso comum que defende a ideia de que todos desinteressam-se pela música atual a partir de certa idade – por que deveríamos normalizar ou banalizar esse desinteresse tão precoce que é, na verdade, demasiado apego às primeiras audições da infância e adolescência? Não seria melhor fazer compreender que os paradigmas se transformam constantemente e, portanto, os critérios de qualidade mudam. Melhor dizendo, não é ideal medir o Jazz com a régua da Música Serialista, o Rock com a do Jazz, o Techno com a do Rock, a contemporaneidade com a do minimalismo profundo e pouco dinâmico. Também é o comércio fácil que tenta convencer que nosso gosto musical não deve evoluir com a maturidade, a concepção de que a contemporaneidade é inventada e conduzida somente por mais jovens é, de fato, propaganda dos anos 1960 que caducou, uma suposição mercadológica que a Música Acusmática (eletrônica erudita) nunca comprou.
A intensão em apontar esse fenômeno não é culpar o leitor/ouvinte, mas fazer reconhecer que, sim, com certeza, é o mercado que esconde os variados nichos da Música e a possibilidade da coexistência diversa e inrotulável ao invés da mesma massa homogenia que molda pessoas, é o limite que acaba nos (re)direcionando às mesmas estruturas esgotadas de novo e de novo e de novo. É preciso reconhecer isso inclusive em algumas cenas musicais que se consideram alternativas, do contrário, segue o ciclo de descarte.
É evidente, mas importante sublinhar, que para músicos, produtores, DJs, instrumentistas, musicólogos, entusiastas e demais profissionais da área, o jornalismo musical, a valorização de selos pequenos, o Soulseek (e outras redes de compartilhamento), o Discogs (banco de dados discográfico) e o desejo de mover-se para além do que é conduzido pelo comércio raso das plataformas de streaming são ainda muito necessários. O Bandcamp (plataforma/loja online para artistas independentes) é ótima alternativa, mas quem guia o ouvinte semileigo pela variedade infinita dessa plataforma?
Raja _ Yelleo E _ 2014
Será que hoje no país existem eventos suficientes que alcançam essa variedade da música mundial? Talvez a imensa maioria dos músicos e DJs estejam atados ao gosto popular e temem avançar. E sobre os teatros e salas de espetáculo, será que conseguem gerar o interesse pelo século 21? Nem mesmo pela vanguarda do século 20. Como podemos então gerar novos nichos atualizados no Brasil?
Precisamos de pontes, malhas ferroviárias que se multiplicam.
Para citar um único exemplo de onde estamos: O álbum mais importante de Juke (Chicago) foi produzido em 2013 por DJ Rashad, o gênero continua evoluindo e está cada vez mais presente em fusões de Techno. Acompanhamos esse processo? Mesmo quando pensamos no Dubstep surgido há quase duas décadas, qual vertente de fato irrompeu por aqui – o original ou o EDM de Skrillex vendido como Dubstep? Quantas vezes na década passada ouvimos por aí o som de Andy Stott, Actress, James Blake, FaltyDL, Jimmy Edgar, Laurel Halo, Lanark Artefax, Arca, Jlin, algum(a) africano(a) do selo Nyege Nyege [esses, sim, vieram recentemente] ou chinês(a) do selo SVBKVLT só para ficar nos elementares, nos mais conhecidos de um pequeno público que tem acesso e se interessa em estar e viver, de fato, no século 21?
Daqui parte a FONTE.
imagens:
vídeo [desconhecido, agradecemos o contato]
dançarinas: @faefolkofwillowood
espaço alaranjado cônico com pessoas: Gabriel Aronson @antomaton using Midjourney